lembra-te - eu morri às tuas mãos.
rasguei-te a pele com os dentes, mordi-te coração e cuspi-o, limpei a boca e segui.
31.10.11
tenho esta tendência para fugir das coisas que cristalizam. do que me prende. do que já vi. mas à medida que avanço percebo que o que se vê não se distingue assim tanto entre pontos. e isso tira-me a razão para ir sem que me dê mais vontade de ficar. eu sei. a culpa é minha. mas eu nunca disse que não era. e a única certeza que tenho é que me partilho com uma montanha de dúvidas.
vim a reconhecer que nunca havia percebido muito bem quando te ouvia coisas como "não sinto a realidade" ou "fiquei sem referências de espaço e tempo". talvez até desdenhasse tudo o que ouvia. com aquele meu ar de enfado de quem pensava tudo saber. talvez até adoptasse uma postura paternalista. até eu própria ter entrado nesse mundo para onde fui empurrada. onde a realidade passa a não ser (ou a ser em várias frentes). e o espaço e o tempo se misturam até nos desorientar os sentidos. e sabes, às vezes faço de conta, mas ainda não saí de lá. desse mundo que é sem ser. ou que não parece ser, ainda que seja mais que qualquer outro. contudo, em esforço, vou mantendo os pés assentes. mas é difícil. e é sobretudo difícil fazer perceber a quem não saí do espaço da razão que o mundo além é tão vivo quanto aquém. e ainda assim, às vezes, gostava de ser só aqui. a dispersão por dentro consome. por isso hoje percebo-te a necessidade de agarrar a matéria. mas eu não consigo ainda fazê-lo. não tenho suficientes razões para isso. vagueio, portanto, no lado nenhum.
30.10.11
talvez seja cíclico. mesmo sem que queiramos que o seja. talvez seja coincidente. à distância. e talvez o que eu sinto continue a ser o que tu sentes. por vezes. talvez nos encontremos por aí onde mais ninguém nos toca. ou talvez seja só uma espécie de sonho que nos deixa à deriva sem saber por onde. talvez seja isto o que alguns chamam de saudade. mas há dias assim. em que nos cruzamos algures. hoje não fica raiva. talvez só um pouco de mágoa. e vontade de chegar perto. e falar sem palavras. falta-me isso sabes. é estranho não o conseguir fazer com os demais. era tão fácil antes. mas se formos bem a ver, era fácil só por seres em mim. talvez essa seja a nossa lição - que o mundo é enorme cabendo-nos na mão. e o que vem construído de trás talvez não precise de mais. talvez nos faltasse ar novo apenas. e talvez o apenas tivesse sido o caminho certo. mas ainda assim, ainda assim... hoje voltamo-nos. e eu sei que também sabes.
lembro-me de isto começar a tocar. e do silêncio que se fez. aquele desconcertante silêncio. e de um abraço. um abraço inesperado. e de uma voz ao ouvido que disse "é tão triste". lembro-me que sorri. para travar o nó que se criou. e talvez para disfarçar o que sabia que era mas não queria que fosse.uma despedida.
25.10.11
não sinto nada.
absolutamente nada.
por isso, não tenho nada para dizer.
reinvente-se o corpo.
e os lugares onde os passos caminham.
as palavras. as palavras. faltam-me as palavras ao monte.
fugiram.
também tenho falta do inverno.
e de cheiro a bolo saído do forno.
mas não me apetece fazer bolos.
nem tenho vontade de guardar o biquini.
24.10.11
o nós não é mais que um grupo, maior ou menor, de egos encostados. devíamos conhecer (e assumir, e aceitar) melhor os eus. talvez assim não houvesse tantos nós falhados. mas mete medo olhar o espelho. e é sempre mais fácil apontar o dedo com vozes trémulas. por isso, o nós que falha é, quase sempre, um grupo, maior ou menor, de eus, mais ou menos, covardes! mas hoje estou azeda, e amanhã o mundo pode parecer-me mais sério. ou não.
23.10.11
21.10.11
e é tão engraçado perceber que, enfim, se não sente nada. e é tão engraçado perceber que apesar de, enfim, se não sentir nada, o ter-se sentido tudo em um qualquer momento nos abriu uma porta qualquer por onde entram coisas que não sabíamos antes. e é tão engraçado perceber que é exactamente esse processo que nos torna mais pessoas - apesar de se não sentir nada em um qualquer momento do caminho. porque não sentir nada, tendo-se já sentido tudo, é o ponto de partida para se reconhecer outros sentires prestes a explodir-nos na cara. e isso é engraçado. às vezes também mete medo. mas é um daqueles medos bons.
está tudo bem. está tudo muito bem.
20.10.11
há coisas que só nos abandonam se as deixarmos ficar. parece um contra-senso. mas não é. a fuga ou a expulsão não resolvem. há coisas que têm de ser gastas. quando se gastam não há lugar a lamentos. ou desculpas. segue-se sem contemplações à rectaguarda. mas, em não se gastando, os "ses" impedem os passos. e a cura. temos sempre demasiados "ses". quase todos resultantes do medo - "e não sendo assim, como é que vai ser". coragem é o que nos falta quase sempre. e coragem não é fugir. nem expulsar. é saber quando chega o fim. assumi-lo. e começar tudo de novo com os pés assentes em tudo o que é velho. trágico é que, quase sempre, o movimento não tem só um sentido. e nem sempre os vários sentidos possíveis são compatíveis. e é exactamente aqui que se revela o egoísmo. ou a condescendência. ou a autocomiseração. tudo pecados capitais. o inferno deve ser imenso, portanto. e começa aqui, quase sempre.
19.10.11
Les mystéres des voix Bulgares - Polegnala e Todora
nesta altura, o bairro alto era a minha segunda casa, usava doc martens roxas, misturadas com vestidos curtos, meias de ligas e/ou collants meio estranhos. fiz o meu primeiro piercing. tive o cabelo pintado de verde. e um delírio que durou uns meses com um pseudo-namorado punk à conta do qual me ia afogando no tejo. mas passava muito do meu tempo a ouvir isto. e lorena mackennit. e wim mertens. enquanto estudava ciência política, as ordenações afonsinas, o estado de necessidade e a acção directa. nunca fui muito linear, de facto.
18.10.11
"como está o meu ser plural favorito?". apesar de tudo, ele que partilhou tão pouco tempo da minha vida conhece-me tão bem. e foi assim que começou a minha manhã. suponho que se trate de uma tentativa enviesada de equilibrar as coisas - hoje estou com mais aversão a gente do que o costume. preciso de campo. de ter os pés descalços na terra. e de sons descivilizados. preciso de sol nas palmas das mãos. e de um bloco de papel em branco. tenho a cabeça à roda e o estômago em forma de convulsões. preciso de silêncio. preciso de silêncio. sim, sou plural. e às vezes não gosto de nada. nem de ninguém. mas há dias que aparecem assim tentativas enviesadas de equilibrar as coisas. e pessoas de quem gosto muito relembram-me que não vagueio só no mundo.
The most radical revolutionary will become a conservative the day after the revolution
Hannah Arendt
e é por isto que, apesar do aspecto romântico da coisa, não tenho grande fé em revoluções. na evolução sim, deposito toda a esperança. mas isso é outra coisa - é mais difícil e mais exigente. exige responsabilidade, integridade, transparência, respeito e ética. dito isto, tirando algumas palavras de ordem absurdas, alguns cartazes tontos e algumas reivindicações e/ou queixas ridículas, no dia 15 de outubro vi essencialmente diferentes sectores da sociedade civil unidos com um objectivo comum - a demonstrar os seus receios e, timidamente, a exercer o seu poder.
e vi muita gente descomprometida. à esquerda. e à direita. talvez estejamos no bom caminho. mas a corrida ainda mal começou. e todos deveríamos parar e dizer em conjunto - falhamos redondamente no nosso papel de cuidar de nós próprios, do país e do mundo. portanto, que não se faça a revolução. que se evolua. é esse o caminho. no entanto, temos de ser claros a perceber que, de uma forma ou de outra, o caminho vai ser penoso - desde há muito que nada está verdadeiramente na nossa disponibilidade. é que a mão invisível existe mesmo. e é filha da puta. é ela que tem de ser amputada.
15.10.11
14.10.11
13.10.11
não nos distinguindo sobremaneira no essencial, é curioso perceber como somos todos tão diferentes na reacção ao mesmo. e como, quase sempre, sobrevalorizamos as razões. ou a falta delas.
ocorreu-me, entretanto, que talvez sejam os excessos que dão maior sensação de sermos iguais aos (ou, de certa maneira, melhor aceites pelos) demais. a placidez é confundida em demasia com apatia. ou então frieza. a assertividade, com arrogância. ou então frieza. a intransigência, com teimosia. ou então frieza. o dizer "não", "basta", "fim", com insensibilidade. frieza, portanto.
simplificando, são os excessos, as lágrimas berradas ou as justificações esticadas ao limite na tentativa de nos perdoarmos a nós próprios que nos aproximam dos quase todos. ainda que essa proximidade seja, quase sempre, oca. e falsa. e estúpida, até. sobretudo se os excessos, as lágrimas berradas ou as justificações esticadas ao limite tiverem público. esse mesmo público que se deleita quase sempre com os excessos alheios.
eu assumo com as letras todas: no processo de decisão sou assertiva, intransigente e, sempre que necessário, digo "não", "basta" e "fim" sem quaisquer remorsos e, quase sempre, com placidez. nos padrões mais ou menos convencionais devo ser fria, portanto. ah, e não gosto de público. os meus excessos são sempre privados.
12.10.11
tudo começa com passos em direcção ao abismo. e uma frase passa a ser constante: "eu não sei mas sei". descobrimos, então, que o abismo somos nós. desmontar o paradoxo "eu não sei mas sei" passa, depois, a ser um modo de vida. e, ainda que (com esforço) guardemos a sanidade, eventualmente percebemos que o caminho que guarda a história nos ensina que há coisas que se sabem só porque sim. e alguns porquês passam a ser desimportantes.
11.10.11
10.10.11
é um espectáculo ignóbil. o cair das máscaras. e contudo agrada-me que se revelem as sombras negras. consequência da intensidade da luz. e quem não sente deus devia fazer um esforço para sentir. e, oh... não! ele não tem barbas brancas. nem é diferente de ti ou de mim. mas tem voz. e disse-me "age em consciência, não prejudiques deliberadamente ninguém, vive e sente em verdade e serás livre". e assim é. e quem não acredita em anjos da guarda devia passar a acreditar. os meus seguram-me todos os dias. são enormes. imensos. e dão-me beijos na testa. mas sabes (?) viver na sombra é mais fácil. não se lhes distinguem os erros. ah... e se quiseres sair daí, prepara-te para ficar sem roupa. e com um espelho como teu melhor amigo. e boa sorte.
Bon Iver - I can't make you love me
...mas o que me revolve mais por dentro é essa tendência para a condescendência. o paternalismo. o tratarem-nos como idiotas. "tu não percebes! tu não percebes! tu não percebes!" tudo o resto é difícil. as vozes. a falta. a desistência. mas ultrapassa-se. e quando se está do lado de lá, erguemo-nos mais fortes. mas a condescendência. o paternalismo. o tratarem-nos como idiotas... isso eu não suporto. nem perdoo.
9.10.11
não é um bailado bonito. é antes uma espécie de exercício contorcionista dos nossos medos. a solidão. a rotina. a tristeza. a violência. a submissão. a revolta. a clausura. a solidão outra vez. e outra. e outra. e outra. o lixo emocional acumulado. o que está a mais. e o que temos a menos. a solidão novamente. a loucura. a desrazão. o hábito doente. o caos. e a ordem pontual forçada. a tentativa de reinvenção. nós. e um espelho em palco. PETS é mais ou menos isto. ao fim de 10 minutos tinha os olhos borratados. no final fiquei quieta. nem consegui aplaudir à primeira. depois de uns minutos sentada, saí em silêncio. não é um bailado bonito. é antes incómodo. porque em algum momento todos nos podemos rever algures no palco. e eu revi-me em vários.
8.10.11
7.10.11
6.10.11
4.10.11
é difícil ultrapassar. fazer as pazes. colar o coração. o corpo. a alma. é difícil compreender. é difícil aceitar. ver a magia transformar-se em terror. e é sobretudo difícil dizer adeus. diz-se quase sempre com raiva. e sem verdade. e sempre com lâminas a cortar-nos por dentro. o que é não precisa de razões. e o que deixa de ser também não. talvez seja isso que precisamos de aprender a aceitar. talvez seja isso o que se chama crescer. é difícil. mas vai-se tornando mais fácil. e não é o tempo que cura. (até pode haver remendos. mas não há cura para corações partidos.) é antes a alma que dilata de modo a caber mais lá dentro. ao explodir tornámo-nos imensos. e isso dói. mas quem já sentiu um coração desfazer-se não vai querer menos do que outra possibilidade de ele se vir a estilhaçar. menos é pouco. a paz é arrebatada. se assim não for chama-se sono.
3.10.11
é uma coisa que me intriga, e à qual volto com insistência: onde devem ficar os outros no nosso processo de escolha? como lidar com os rebuliços que causamos sem que queiramos? será seguir o caminho que pensamos ser o nosso apenas um acto egoísta? e se errarmos? e se errarmos? e como explicar a quem fica para trás? devemos desculpas? ou sou só estúpida em preocupar-me com isto? então e se for ao contrário? foda-se... às vezes somos bárbaros! e isso, é sempre mau?
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