17.7.12

de maputo: em tempos eu tive uma empregada doméstica. chamava-se célia. não era grande empregada doméstica mas, pelo menos, guardava a casa, cozinhava qualquer coisa e arrumava-me a roupa. eu, que não tenho de todo perfil de neo-colono, gostava imenso dela, fartava-me de rir com ela, pedia-lhe para me ensinar changana, insistia que ela provasse a nossa comida, pedia-lhe para me ensinar receitas de cá e coisas assim. éramos amigas. e ela sabia que se precisasse podia contar comigo. e precisou várias vezes. quando voltei a  portugal a célia chorou, e quase me fez chorar. aparentemente, ainda hoje diz que eu sou a "menina dela". ora a célia quando veio trabalhar para minha casa, apesar de ganhar bem acima do ordenado mínimo, ganhava - como quase todos os moçambicanos sem grande formação - incrivelmente mal dentro dos nossos padrões (julgo que algo como cerca de 50 ou 60 euros na altura). esse dinheiro era quase só para pagar a escola dos filhos. para o resto das despesas, tinha uma banca em frente a casa onde vendia um pouco de tudo. quando o pai faleceu, pediu-nos ajuda para poder ir ao funeral lá no norte. e para pagar a festa de luto que é obrigatória não vão os espíritos ficar zangados. e nós, obviamente, demos. e assim foi levando a vida como pode, com um ex-marido violento pelo meio e uma casa de filhos para sustentar. hoje, 5 anos depois, a célia trabalha na copa de um escritório, continua com os seus negócios, mandou o ex-marido às urtigas com uns sopapos na tromba de brinde, está a tirar a carta de condução e o filho está a acabar a academia militar. quando há dias lhe ofereceram trabalho como doméstica disse que "pedia muita desculpa mas já não se vê a fazer isso e que sentia como se fosse andar para trás".  a célia é uma das minhas heroínas.

1 comentário:

Espiral disse...

Passou a ser das minhas =)